De acordo com estudo do American Press Institute, a redução da frequência de impressão de jornais deve ser parte de um planejamento de transferência para o digital, e não um corte de custos para sobrevivência financeira imediata.

O encolhimento dos jornais impressos em todo o mundo não é novidade. Acabar com o produto em papel ou reduzir a frequência de impressão geralmente é um imperativo de corte de custos para a sobrevivência financeira imediata. Ou seja, pode ser feito sem o devido planejamento.

Este estudo do American Press Institute afirma que, diante desse cenário, a melhor estratégia é tomar decisões proativas sobre a diminuição das impressões, como um passo em direção a um futuro digital de longo prazo. Ou seja, fazer a transferência para o digital de maneira planejada.

Faz todo sentido, né? Os autores entrevistaram editores de jornais, executivos e especialistas do setor com experiência direta na redução da frequência de impressão de jornais.

Vejam os principais highlights da pesquisa:

  • Reduzir os dias de publicação do jornal impresso deve ser o primeiro passo de uma transição gradual e cuidadosamente planejada para o digital.
  • A decisão de quais dias de impressão serão cortados requer um planejamento logístico e financeiro significativo. Isso envolve o cálculo de economia de custos; trabalhar com anunciantes para mudar os dias de anúncios; olhar para os hábitos do leitor; e decidir sobre o preço da assinatura.
  • A comunicação com leitores e anunciantes é fundamental ao eliminar os dias de impressão. Os publishers podem usar várias táticas, desde a publicação de artigos, colunas e anúncios, até reuniões com líderes da comunidade e de negócios e bate-papos individuais com assinantes.
  • Os jornais que cortam impressão já devem ter construído um negócio digital que se baseia em um profundo entendimento de seu público. O tempo e os recursos economizados com a impressão devem ser dedicados a descobrir como aumentar a proposta de valor para assinantes digitais.

Transformação de longo prazo ou corte rápido para sobrevivência?

Cortar os dias de publicação de um jornal pode economizar dinheiro, pois significa menos caminhões, papel e impressões. Mas, segundo os pesquisadores, isso não é suficiente para garantir que um jornal continue existindo e servindo sua comunidade. É necessário haver uma estratégia que reconheça que os hábitos dos leitores vão além do jornal diário de sete dias. 

Ken Doctor, analista da indústria de mídia e autor de “Newsonomics”, afirma:

“Todo mundo sabe que, em algum momento no futuro, os jornais de sete dias simplesmente não serão viáveis. Estamos nos movendo em direção a um mundo principalmente semanal e digital. Existe uma inevitabilidade, e a questão para a indústria jornalística é se ela enfrenta isso de uma maneira organizada ou se faz isso por desespero”.

A pressão sobre o modelo de sete dias não é nova, de acordo com a professora Penelope Abernathy:

“A maioria dos editores de jornais reconhece que, mesmo nos melhores momentos, houve apenas três dias lucrativos, que eram normalmente o domingo popular, uma quarta ou quinta-feira repleto de inserções ou anúncios de supermercado, e sexta-feira, que levava ao fim de semana com conteúdo de entretenimento e publicidade”.

Identificar a proposta de valor exclusiva da publicação e cortar qualquer coisa que não funcione mais são medidas necessárias, de acordo com Albernathy.

Um ponto crítico que o estudo identificou é que nem todo leitor de jornal impresso se torna necessariamente um leitor do digital. Por isso é tão importante construir um negócio digital antes do corte das impressões.

Um exemplo disso é o The State Journal, jornal de Kentucky (EUA), que eliminou sua edição de segunda-feira em 2018, após um ano de planejamento. Ao calcular e considerar que o melhor caminho era investir no digital, o editor Steve Stewart explicou que houve uma comunicação antecipada com os leitores, o que fez com que 200 assinantes do impresso fossem convertidos para o digital mesmo antes do corte. Segundo ele, a eliminação das despesas de uma edição impressa a cada semana permitiu ao jornal manter o tamanho de sua redação e direcionar seu trabalho para o digital.

Planejando a mudança

1. Escolha qual ou quais dias cortar

Ao invés de simplesmente eliminar os dias com menos publicidade (a opção mais óbvia), outros fatores locais devem ser levados em consideração, de acordo com o estudo: cobertura esportiva ou reuniões do governo local em determinados dias.

O suporte a necessidades específicas do anunciante também pode contar na tomada de decisão. Segunda e sábado são, historicamente, os dias menos lucrativos.

2. Pense na matemática, na logística e ouça o consumidor

Não é difícil supor que diminuir a frequência de publicação de jornais impressos envolve planejamento logístico e financeiro, que inclui caminhões e motoristas, papel-jornal e tinta, pré-embalagem, praças, vendas em cópia única, equipe de design/ diagramação, etc. Ou seja matemática.

Ken Herts, do Instituto Lenfest, diz que em todo jornal sempre há alguém que conhece a logística, mas muitas vezes esse conhecimento não é organizado, o que faz com que o departamento financeiro trabalhe às cegas. Para ele, a decisão de parar de imprimir em determinados dias depende de quanto da receita atual pode ser mantida ou alterada para outros dias.

Orestes Baez, publisher do grupo Michigan, disse que antes de fazer uma alteração na frequência, os executivos precisam analisar os custos de produção, a economia de papel-jornal, a receita diária de publicidade e o impacto nas assinaturas. 

Na Carolina do Norte, o Salisbury Post planejava perder receita em cópia única para as segundas e sábados impressos que eliminasse. Mas a reação dos leitores acabou indicando outra coisa. De acordo com o editor Greg Anderson, “aumentamos nossas taxas de cópia única ao mesmo tempo e isso compensou qualquer perda de volume”.

Outra opção é, ao invés de reduzir a frequência de publicação, cortar determinadas praças, locais ou pontos de venda.

3. Troque anúncios para preservar receita

Uma questão importante é como encontrar espaços para anúncios após a redução nos dias de impressão. Uma saída é analisar os clientes com anúncios nos dias cortados, dividi-los em categorias e elaborar um plano para movê-los para outros dias.

Ao fazer isso, Greg Anderson, do Salisbury Post, identificou que “não perderíamos um centavo em anúncios públicos por ter dois dias a menos de impressão, mas no caso da publicidade imobiliária no sábado, precisávamos apresentar um plano para preservar a receita dessa categoria”.

Os autores ponderam que, embora muitos anunciantes mudem de um dia para outro após o corte na frequência de publicação, pode haver perdas daqueles que pagaram pelos sete dias.

4. Decida o preço das assinaturas para menos dias de entrega de jornais

Outra questão importante, de acordo com o estudo, é a decisão de manter ou alterar as taxas de assinatura. Muitos leitores podem se opor a pagar a mesma quantia por menos. Uma solução, segundo Ken Herts, é acostumar os assinantes a menos dias de impressão e mais opções digitais.

O Daily Sentinel, no Colorado, lançou novas opções de assinatura após a redução dos dias de impressão. Entre elas está uma assinatura híbrida com desconto: entrega impressa de apenas três dias contendo cupons e revista, além de acesso à edição digital nos sete dias. Outra opção é uma assinatura de sete dias somente para edição digital.

Os autores informam que vários executivos entrevistados optaram por manter os preços inalterados, apesar das reclamações esperadas dos assinantes. Uma das razões é que diminuir o preço das assinaturas poderia significar menor percepção de valor por parte dos leitores. Para um dos publishers, “é como se nós estivéssemos nos desvalorizando”.

Alguns argumentos podem ser usados nessa comunicação com o leitor:

  • Garanta que os leitores saibam que, mesmo com menos dias de publicação, irão receber a mesma quantidade de notícias impressas.
  • Lembre que eles também podem obter conteúdo no digital e nas mídias sociais.
  • Garanta que a comunidade entenda o valor de o jornal continuar a existir.
  • Melhore a experiência para os assinantes, com cadastros mais fáceis e cobranças automáticas.
  • Reforce outros aspectos de valor do jornal, como cupons de desconto que representam economia semanal para os leitores.

Diante de tudo isso, os autores apontam que a transição para o digital, se feita de maneira planejada, pode garantir a sustentabilidade financeira da organização jornalística.